Mulheres transformadas pela educação

 

Professoras e apenadas do Presídio Estadual Feminino de Lajeado relatam como a experiência em sala de aula mudou suas vidas


Todas as segundas-feiras à tarde, as professoras Marlise Anderle da Silva e Clarice Maria Colognese literalmente escrevem novas histórias de vida junto de outras mulheres. Ambas são docentes do Núcleo Estadual de Educação de Jovens e Adultos - Neeja Liberdade, instalado no Presídio Estadual Feminino de Lajeado Miguel Alcides Feldens.

Uma tarefa encarada por poucos e que, de fato, tornou-se um divisor de águas para elas. As duas professoras atuam na instituição estadual desde 2017, quando a ala feminina foi inaugurada dentro do complexo penitenciário de Lajeado. Hoje, possuem 15 alunas.

Marlise ministra aulas de Português, Inglês, Artes e Educação Física, enquanto Clarice atua na área de Ciências da Natureza e Matemática. Antes, as docentes já davam aulas em presídios masculinos da região, também por meio do Neeja Liberdade.

Mas foi com as mulheres apenadas que elas aprenderam na prática o significado da palavra sororidade. O termo engloba a prática de empatia, confiança, cooperação e acolhimento entre mulheres e acontece dia a dia entre estas professoras e alunas.


Clarice Maria Colognese

Professora há mais de 26 anos, Clarice encontrou no Neeja Liberdade algo único. “Aqui me senti professora, educadora, soube o que é, de fato, o poder transformador e libertador da educação. ”

Na sala de aula, bem mais que aprendizado pedagógico, elas trocam experiências. “Diferente dos homens, as gurias querem um momento de conversa. Ali compartilhamos angústias, coisas de mulher, como sempre digo”, resume Clarice.


Marlise também sentiu este impacto ao dar aulas para pessoas privadas de liberdade. Atuante no Magistério há 36 anos, teve receio ao adentrar no presídio. As salas gradeadas, os espaços fechados, preocuparam a professora inicialmente. Mas depois de ter contato com os alunos, perceber a força de vontade deles de aprender e o respeito com os professores, todo o restante deixou de ter importância.


Marlise Anderle da Silva

“Estar aqui me dá força, me estimula. Encontro aqui dentro do Neeja Liberdade alunos que verdadeiramente valorizam o professor”, afirma Marlise. Como mulher, sente-se privilegiada em poder ajudar outras mulheres a aprender.

 

“Eu me sinto grandiosamente feliz por ter a oportunidade de auxiliá-las através da educação a terem um pensamento diferente e também de poder demonstrar a elas que há pessoas interessadas nelas, que acreditam no potencial que possuem. ” 


 

Uma escolha transformadora

G.N., 40 anos, matriculou-se na escola neste ano, assim como A.C.L., 35 anos. Ambas cursam o Ensino Fundamental e deram-se a oportunidade de encontrar nos estudos um novo caminho de vida - deixado para trás, lá na adolescência.

Elas não pisavam dentro de uma sala de aula há mais de 15 anos. Pararam de estudar para trabalhar e cuidar dos filhos. Agora desejam dar aos seus pequenos um novo exemplo. “Aqui a gente se distrai e aprende. É muito bom, aprendemos umas com as outras. Estou redescobrindo o que é estudar”, afirma G. N.

“É ótimo, maravilhoso. A gente esquece o mundo lá fora”, resume A.C.L. Para ela, estar com as professoras é gratificante. “Todas são muito alegres, trazem isso para a gente. ” A sua maior recompensa é o conhecimento, bem como a remissão de pena conquistada através da frequência. “É um meio de voltar logo para casa, mas também para terminar meus estudos”, conclui.

 


Para elevar a autoestima

Diretor do Neeja Liberdade, Adalberto Francisco Koch, coordena o trabalho educacional nos presídios masculinos de Lajeado, Arroio do Meio e Encantado, e feminino de Lajeado. Para ele, o mundo feminino exige outro olhar. “Há uma série de questões emocionais e sociológicas a serem consideradas”, resume.

Supervisora da instituição, Adiles Teresinha de Azevedo, relata que o grupo diretivo e docente procura realizar constantemente atividades para elevar a autoestima das apenadas.

Entre estas, ações carinhosas em datas comemorativas são celebradas para ressaltar o quanto elas são importantes e merecem atenção. “Para nós, elas são alunas. As demais questões elas resolverão com a Justiça”, enfatiza a supervisora.

Adiles Teresinha de Azevedo

Adalberto Francisco Koch


 

 “Estrutura excelente”

A professora Marlise destaca que a estrutura oferecida às apenadas é também um ótimo incentivo. A sala de aula, além de classes e cadeiras em ótimo estado, conta com televisão, ar-condicionado, computadores e minibiblioteca – adquiridos com recursos das Varas de Execuções Criminais de Estrela, Lajeado e Teutônia; Município de Lajeado e empresas do Vale.

As apenadas podem cursar a etapa 2, referente aos anos finais do Ensino Fundamental ou a etapa 3, correspondente ao Ensino Médio. Porém, independente desta definição, todas as interessadas são atendidas. Hoje, inclusive, há estudantes em fase de alfabetização na escola. Cinco docentes ministram o conteúdo de forma multiseriada, de segunda à sexta-feira à tarde. As avaliações são feitas semestralmente, após o cumprimento de 400 horas-aula.

A segurança do local está sob responsabilidade da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) e a parte educacional é compromisso da 3ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE).

 

 

 

 

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